Saturday, September 06, 2008

FÓRUM DAS COMUNICAÇÕES

Estive na simpática faculdade de Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora dia 4 de setembro para dar uma palestra sobre criação de storyboard para os alunos dessa instituição. A produção foi da empresa júnior Acesso Comunicações, dos próprios alunos da faculdade. Todos muito organizados, público de 150 pessoas no auditório, alunos atentos às cenas de filmes famosos. Dei entrevista na Tribuna de Minas de domingo, dia 7 de setembro, cuja matéria transcrevo abaixo:




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CADERNO DOIS




Produções audiovisuais
O cochilo do urso
Raphaela RamosRepórter
“O cinema não tem fronteiras, nem limites. É um fluxo constante de sonho.” Quando Orson Welles construiu esse pensamento, sabia que a humanidade jamais deixaria de sonhar e, portanto, não enterraria o cinema, nem mesmo na pior das hipóteses. Ainda que, vez ou outra, passe por uma fase agonizante, a sétima arte costuma tomar fôlego na sensibilidade de cada geração e voltar renovada, pronta para exibir as fantasias do mundo todo. Pelo menos, é o que se pode observar no microcosmo da produção local. Se a década não tem sido a mais fértil de todos os tempos para a cidade, o ritmo das discussões tem atingido o olho do furacão. E isso, em plena era digital, repleta de mudanças e estímulos.
O cineasta juizforano Marcos Pimentel, que deve lançar seu novo documentário, “Urbe”, ainda em setembro, é um dos exemplos de resistência e otimismo. Não só porque não pára de criar, mas também porque continua prosseguindo na captação em 35mm. “É aqui que me identifico.” Diante de tantas oportunidade mais acessíveis e baratas, optar pelo bom e velho cinema é uma questão de coragem. Principalmente porque o principal incentivo local, a Lei Murilo Mendes, possui um teto insuficiente para as ações da área.
É o que diz a produtora e cineasta Lilian Werneck, que, recentemente, rodou seu curta-metragem em vídeo “O móbile: admiração”. Além de ter problemas para pagar a equipe por conta do atraso da terceira parcela da Lei 2007, Lilian precisou investir dinheiro do próprio bolso para finalizar o trabalho, gravado em HD. “Os custos com produção ficaram por minha conta”, explica, triste por ter desvinculado o lançamento do curta - que narra o amor entre duas mulheres - da Rainbow Fest.
Sobre o valor máximo da Lei Murilo Mendes, o professor e diretor de TV Cristiano Rodrigues tem a mesma opinião, mas acrescenta que os realizadores deveriam ultrapassar as montanhas e buscar recursos em editais nacionais. “As pessoas precisam circular mais.”
Para Pimentel, o problema não está na quantia oferecida pelo incentivo municipal, mas, sim, na opção de aprovação dos projetos com apenas 80% do total previsto. “Quando isso acontece, não sabemos onde cortar gastos”, comenta o cineasta, que teve seu documentário contemplado com uma redução de 10%. “Usei prêmios financeiros de outros filmes e contei com muita camaradagem.”
'Time is money'Se, por um lado, os avanços nas formas de captação contribuem para o aumento do número de obras audiovisuais, boas e ruins, por outro, os grandes empreendimentos locais ligados ao cinema estão passando por um período de hibernação e anomia. Essa é a opinião do professor e ator Robson Terra. Para ele, a fervura observada na área nos anos 90 não se repete na década atual, ainda que existam mais cursos e especializações. “O mercado tem tido uma visão mais empresarial e menos artística”, avalia. Lilian Werneck levanta outra questão, vendo a capacidade dos profissionais de maneira positiva. “Eles sabem o que fazer, mas, muitas vezes, não têm a oportunidade.”
E foi exatamente com a intenção de qualificar os futuros produtores que Robson ministrou sua oficina de Crítica de Cinema e TV no V Fórum das Comunicações de Juiz de Fora e Região, promovido nos dias 4 e 5 de setembro, para discutir o cinema digital. “Mesmo que não se tornem críticos, esse jovens precisam organizar suas avaliações.” Outra que também levou sua experiência para o auditório da Facom foi a professora de cinema e teatro Myriam Pessoa, de Belo Horizonte. Esmiuçando as técnicas e funções do storyboard, ela abordou novidades sobre as vantagens de se escrever com imagens. A visitante também falou sobre a valorização do vídeo digital. “A inovação precisa de um lugar de financiamento e exibição no país, mesmo tendo se fundido ao cinema”, comenta, revelando-se mais uma entre os defensores das revoluções pós-modernas.
Durante o fórum, a II Mostra Acesso exibiu curtas e microfilmes criados pelos alunos. Álvaro Dyogo, que está no sexto período de comunicação, participou com dois trabalhos, filmados para disciplinas do curso. Além do ficcional “Nem tão felizes para sempre”, exibido no Primeiro Plano do ano passado, o estudante mostrou a documentário “Revirando o lixo”. Para realizá-lo, ele e alguns colegas passaram dias trabalhando como garis da Demlurb. “Foi uma experiência fantástica, antropológica e ousada.” E o mais interessante é que ela partiu de um simples sonho desenhado entre os corredores da faculdade. Para virar cinema, ou melhor, vídeo, foi um pulo.
Poema visual abrindo 'janelas'O filme, de 15 minutos, aborda os sentimentos que nascem em qualquer centro urbano contemporâneo. Como um poema visual, a câmera acompanha as andanças de um casal de vira-latas e, enquanto isso, abre novas possibilidades de histórias, todas retiradas de raízes juizforanas. “Passeamos pelos temas vida e morte e por tudo que existe entre esses dois pólos”, explica Pimentel, que finalizou a obra com som Dolby 5.1 e aguarda uma resposta oficial do Independência Shopping para lançá-la em breve, usando as salas de projeção de alta qualidade da UCI Kinoplex.
Ao lado de outras realizações de peso, “Urbe” estará na Mostra do Audiovisual Local, do Primeiro Plano Festival de Cinema. O espaço, também conhecido como Mostra da Velha-Guarda, abre as janelas para os produtores mais tarimbados da cidade. Cristiano Rodrigues está entre eles e encabeça o inovador “Zoeira”, uma idéia que reúne dez profissionais convidados de diversas vertentes: cinema, TV, publicidade e arquitetura. A cada mês, um tema retirado de uma canção da MPB será oferecido aos diretores, que terão de três a cinco minutos para contar sua história, em uma verdadeira mistureba de linguagens. “É uma atitude de guerrilha”, avisa Cristiano, explicando que a reunião de curtas será exibida pela internet.
Na sua primeira edição, quase pronta, o “Zoeira” usou os versos “saber amar / é saber deixar alguém te amar”, dos Paralamas do Sucesso, como inspiração para os participantes. A propósito, todos eles recebem a ajuda dos bolsistas da Faculdade de Comunicação (Facom) da UFJF, integrantes de um projeto de treinamento, o Central de Produção. Cerca de oito alunos aproveitam as lições de profissionais como Nilson Alvarenga, Fred Belcavello, entre outros. Alvarenga, que é professor da Facom, levou a galera para um ônibus urbano e rodou, com uma pequena câmera digital, o desencontro amoroso entre dois desconhecidos. “As facilidades tecnológicas trazem novos olhares e mais chances de trabalho.” Belcavello, que também é professor, concorda com as vantagens trazidas pela nova era e destaca a democratização proporcionada pela internet, em que todos têm a possibilidade de emitir notícias. “A proposta do ‘Zoeira’ é a bagunça, no bom sentido. E essa liberdade se encaixa nos dias atuais.”